19 de outubro de 2010

A Hipocrisia e a Sinceridade

O Caminho da Sabedoria Depende
Do Uso Correto das Forças Pessoais

John Garrigues


J. Garrigues (1868-1944)


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O texto a seguir foi publicado pela
primeira vez de modo anônimo na revista
Theosophy”, de Los Angeles, EUA, edição
de dezembro de 1927, pp. 63-64.  O título
original é “The Modern Vice”, e uma análise de
seu conteúdo indica  que foi escrito por Garrigues.

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“Tu vês no outro o que há no teu coração.”


Nenhum defeito ilustra melhor este antigo aforismo que o defeito da hipocrisia. Nenhum erro pode ser mais desprezível, nem mais universal. Sem a sua presença, que tudo permeia, o tecido da civilização deixaria de existir.  Será um exagero dizer isso? Que cada um calcule por si mesmo as consequências de passar 24 horas agindo exatamente como deseja!

Nenhuma filosofia é mais oposta que a teosofia a este vício universal. No entanto, diante da tentação da hipocrisia, nenhum ser humano corre um risco maior que o teosofista.

O caráter do indivíduo - isto é, o seu carma - faz parte do carma humano e do carma nacional. A falsidade consciente e inconsciente em sua alma é inerente à etapa atual da evolução humana. Mas há uma armadilha sutil presente no ato de estudar e admirar uma filosofia elevada e nobre:  esta prática regular estimula  a autoestima a partir da sua capacidade de compreender e de admirar. O altruísmo é frequentemente um outro nome para a autoindulgência. A meditação sobre uma filosofia elevada leva inúmeras vezes ao esquecimento do que a meditação é na realidade - apenas meditação. Neste caso, a planta da autoestima, crescendo desde a lama da natureza humana, produz sutilmente um crescimento tão grande da hipocrisia que chega a ficar  fora de toda proporção.

Havendo nos transformado em teosofistas do ponto de vista intelectual, nós ficamos bêbados com o vinho mental do desprezo por aqueles que não escolheram ser teosofistas, nem sequer de forma teórica.

Tendo obtido algum conhecimento sobre a lei do Carma, o nosso sentimento em relação a quem não compreende esta lei passa a ser - ao invés de compaixão impessoal - um desprezo sorridente, uma vaidosa surpresa diante de tamanha ignorância. 

É muito humano o hábito de recusar-se a pensar em seus próprios defeitos e, com o tempo, hipnotizar a si mesmo passando a acreditar que foram superados.

Mas reconhecer os seus próprios erros, inclusive o da hipocrisia, é muito melhor do que tornar-se hipócrita até para si mesmo, além de ser falso para com o mundo externo. O reconhecimento de um defeito envolve um sofrimento e uma relativa humildade, e isso abre uma brecha pela qual a luz do Espírito pode brilhar na natureza inferior da consciência humana.

Os defeitos não podem ser arrancados por um simples ato de vontade, porque às vezes eles se instalam em cada fibra da natureza. Por outro lado, todas as energias são espirituais, embora estejam sempre em autotransformação.

Portanto, todo o problema pode ser solucionado pela distribuição correta e pelo uso sábio das forças pessoais.  Cada energia que se volta para uma finalidade espiritual e altruísta é uma energia drenada das áreas do eu pessoal inferior, e a recíproca é verdadeira. Se as energias pessoais estiverem completamente devotadas a um uso espiritual, o vazamento delas no mundo do eu inferior cessará.

Sem dúvida, há momentos em que a natureza inferior, tendo recebido devido à nossa insensatez uma energia vital vigorosa e maléfica, irá perceber os perigos do jejum e fará uma perigosa ofensiva. Em tais casos, pode ser necessário fazer durante algum tempo um grande esforço de autocontrole. Mas, em geral, a autotransformação depende de um trabalho construtivo na direção oposta à do erro. São muitos os que, depois de diversos anos ou de uma vida inteira de luta com o eu inferior, apenas se esquecem do eu inferior no serviço altruísta, sem darem atenção a vitória ou derrota pessoais.  

Esse é o caminho mais adequado.

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Sobre o crescimento interior e a transformação pessoal no século 21, leia a obra “O Poder da Sabedoria”, de Carlos Cardoso Aveline.


O livro foi publicado pela Editora Teosófica, de Brasília, tem 189 páginas divididas por 20 capítulos e inclui uma série de exercícios práticos. Está na terceira edição.  

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